Aproveite, a vida é uma viagem
E aí, mano, tudo bom? Belê! Estamos, ou, pelo menos, eu estou aqui. Na fita.
Mais vagabundo que os trens da Central. Lembra dos trens da Central do Brasil? Eu falo dos trens da Central lá do Rio de Janeiro, os da Central aqui de São Paulo eu não conheci direito.
A bem dizer também não conheci direito os trens da Central lá do Rio. Devo ter ido para lá, lá pro Rio umas mil vezes. Isso quando ainda era criança. É que os parentes de meu saudoso pai moravam, quase todos, lá na Guanabara. Que, naquele tempo, ainda era Rio mesmo. Pouco me lembro.
" E "vinheram pra cá""
Isso mesmo, como no dizer deles, a família toda de meu pai, saiu do Nordeste, mais especificamente eram viventes das Alagoas, como dizem os contos e histórias, e veio aqui para o Sul do país. A maior parte ficou no Rio de Janeiro e fez a sua vida por lá. Meu pai seguiu em frente e veio mais para baixo, chegou até ao Paraná, mas voltou para São Paulo. Se "arranchou por aqui", como usavam dizer, foi para os interiores do Estado, foi indo, foi indo, ou veio vindo, veio vindo e ficou.
Criou família. Formou os filhos, três meninas e um menino, eu, no caso, todos bastante estudados, em colégios afamados e bem preparados.
" E assim foi "
A vida foi passando e quando a gente, gente que não sabia de nada, viu, estávamos todos por aí. Ou aqui. Teve mortes na família, claro, ninguém vive eternamente, mas os que ficaram tentaram e buscaram o bem. Fomos poucos. Fiquei pai, e minhas irmãs foram mães, claro.
Com filhos estudados e preparados para a vida. Vida que continua. Perde-se um pouco aqui, ganha-se um pouco ali, estuda-se, prepara-se, batalha-se e "asi pasan los dias", como cantaria Nat King Cole. Lembra dele? Eu falo desse Nat King Cole, claro, nego bom de canto. Cantava macio, cantava gostoso. Lembro do "Cachito?".
" Isso, Cachito! "
"Cachito" era música daquelas que faziam a gente se acalmar e até dançar. "Cachito, Cachito, Cachito mio! Pedaço de cielo que Dios me dió".
Sei lá se é assim que se escreve a letra do tal Cachito!
O mundo todo cantava Cachito.
Mundo bom naquele tempo.
Nunca mais o Cachito, nunca mais o Nat King Cole. Agora tem uns nomes mais complicados, cantando canções que nem canções são, um balacobaco que a gente nem entende em um mundo que se entende menos ainda.
Eu quero o Cachito de volta!
Vê se volta, Nat King Cole. Se fosse eu, voltaria.
Só que não tem volta, não é?
A vida é só ida. E tem que ser aproveitada em cada volta, em cada dia, de um dia para o outro, todos os dias. Cachito pra vida. Doce vida.
" "Y asi" "
"Y asi pasan los dias" - como diziam os versos da canção - "Y yo desesperado y tu, tu contestando quiçás, quiçás, quiçás".
E tome mais "quiçás, quiçás, quiçás", no canto gostoso. Sei lá se era assim ou se é assim que se escreve ou se escrevia. Se não era ou se não for quiçás pra todo mundo Fique claro que a tal palavra quiçás significa até hoje talvez, talvez, talvez. Talvez, ou quiçás, seja isso. Se não for, fique sendo.
Pois é, até o Nat King Cole, que tinha Rei até no nome cantava bonito e suave. Esteve e se apresentou várias vezes aqui no Brasil e o povão gostava. Eu também. E muito. Cenas que ficaram na cabeça de quem ainda era jovem ou quase criança. "I asi se pasaran los dias", com canção e tudo. Ainda bem que está tudo gravado na alma.
" Tem trem indo? "
Taí, a saudade batendo e eu só não pego um trem lá pro Rio de Janeiro porque não sei se os trens ainda saem de São Paulo para o Rio como saiam naqueles tempos. Demoravam o dia inteiro ou a noite inteira para chegar daqui para lá e de lá para cá. Eu, a gente era criança e gostava.
Não tinha essa onda de subir no avião ali em Congonhas-São Paulo e chegar no Rio menos de duas horas depois. Eram quase duas horas sim. Hoje não demora nem uma hora.
Só de bronca eu não vou. Fico aqui por Atibaia. Aproveito e vou conhecer a Pedra Grande. Você já esteve lá? Eu não. Que coisa, não?
" Eu, hein? "
Já virei o mundo, já estive nos States, nas Oropas, como diriam os caboclos, já estive no outro lado do mundo, no Japão, já estive no Polo Norte (aí que frio) e até no Polo Sul (ai que frio também).
Qualquer hora dessas faço como o poeta e vou me embora para a Pasárgada, pois, afinal, também sou amigo do rei.
Vamos nessa?
Aproveite e faça como eu, sonhe.
Sonhe. E sonhe logo porque a crônica está terminando.
Simbora, mano!
Um abraço.
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